A Placa
Votiva Shao Lin é um símbolo utilizado nas academias desse estilo de kung fu
para lembrar a todos os alunos dos princípios mais importantes.
Geralmente
na cor vermelha e disposta próxima às fotos dos mestres falecidos e com
pequenos altares logo abaixo, ela possui uma forte presença confucionista -
prega a retidão moral, o respeito à hierarquia e aos ritos - e recorda
ancestrais importantes de caráter divino.
Segundo o
mestre acupunturista Pan Yi Bo - autor da tradução - a escrita é arcaica e
disposta de uma maneira clássica, uma maneira mais simbólica do que uma escrita
comum.
Keith
Stevens fez as seguintes observações:
Placas são frequentemente
encontradas nos altares chineses. Fabricadas em madeira, apresentam muitas
variações locais e estilos diversos. Elas também possuem um número significativo
de papéis e funções. Os chineses geralmente acreditam que toda pessoa possui
três almas. Quando uma pessoa morre, sua primeira alma é enterrada com o corpo,
a segunda é conduzida à sua placa ancestral e a terceira é enviada para o
Submundo, para julgamento e eventual renascimento. As placas normalmente mais
encontradas, portanto, são as ligadas à ancestralidade. Cada placa representa o
repositório para o espírito de uma pessoa ou de marido e mulher. Elas
geralmente são mantidas em casa, onde são reverenciadas pelos descendentes [da
pessoa falecida]. Alternativamente, podem ser encontradas em salões especiais
nos templos budistas. Os benefícios obtidos com as preces ditas pelos monges
auxiliam os espíritos dos mortos no Além; ao mesmo tempo, desobrigam as
famílias do oferecimento regular de incenso aos espíritos que habitam nas
placas. Há, também, placas ancestrais dedicadas a uma geração inteira dentro de
um clã. Elas são mantidas com placas de outras gerações no altar principal do
templo do clã. Outras placas nos altares representarão uma divindade (ou grupo
de divindades). Estas são geralmente vistas apenas em templos rurais, onde o
custo do entalhe de uma imagem é muito alto para a comunidade. Entretanto,
várias podem ser vistas em altares de templos mais ricos, ficando aos pés da
divindade principal e funcionando como representações adicionais. Finalmente,
há placas muito superiores [em qualidade] - raramente vistas hoje em dia -
dedicadas ao imperador da época em que foram produzidas. O título imperial não
estava na placa; ela simplesmente lhe desejaria vida longa. Essas placas
costumavam ser obrigatórias em todos os principais templos taoístas e budistas.
Elas ficavam na extremidade do altar principal. Através das placas, os oficiais
locais saudavam o imperador em seu aniversário e no Ano Novo Lunar
Definições:
(1) – Título – Os ideogramas iniciais da placa do Shaolin do Norte
(leitura da esquerda para a direita) possuem um direcionamento confucionista.
Segundo o médico acupunturista Pan Yi Bo (tradutor), os ideogramas podem ser
traduzidos por algo como “Mestre Exemplar, Modelo Eterno”, título
tradicionalmente atribuído a Confúcio.
(2) – Código Ético 1 - Nessa coluna (leitura de cima para baixo),
segundo o tradutor, está delineado o papel do verdadeiro mestre de uma arte
marcial. Literalmente, os ideogramas poderiam ser traduzidos por algo como
“Ensinamento de Cultura, Filosofia e Artes Marciais – para Servir o Mundo”.
Novamente, a presença é confucionista, ligada, aparentemente, aos valores
fundamentais de Reverência Fraternal (Ti), Propriedade (Li), Honradez (I) e
Integridade.
(3) – Código Ético 2 – Nessa coluna (leitura de cima para baixo),
segundo o tradutor, está uma afirmação da qualidade da arte ensinada. Os
ideogramas podem ser traduzidos por algo como “Conhecimento correto, forma,
maneira, técnica, princípios – arte marcial ministrada é original e correta.”
Aqui, os elementos se ligam, em um primeiro momento, à afirmação da qualidade
do mestre; a “tradução confucionista” se dá pela associação com os princípios
de Lealdade (Hsin) – para com os alunos, Propriedade (Li) – dos conhecimentos,
Honradez (I) – na afirmação chancelada, por escrito, dos conteúdos que o mestre
domina, e Integridade (Lien) – na correção e originalidade dos ensinamentos.
(4) – “Oferecer” - Aqui, mais uma vez, está presente um elemento
confucionista. “Oferecer”, sem dúvida, remete ao mandamento confucionista de
“Servir o Mundo”.
(5) – “Servir” – A palavra é a própria essência do Confucionismo, na
razão em que remete à virtude e ao desprendimento como qualidades fundamentais
ao ser humano correto.
(6) – “Zhou Tong” –. A primeira referência encontrada relaciona Zhou
Tong (o “Pequeno Rei”) a Yue Fei. Ele teria ensinado ao general de Song as
técnicas de um estilo de Kung-Fu chamado Chuojiao (Shuai Jiao). A segunda referência é literária:
Zhou Tong é um dos personagens da novela clássica “Os Fora-da-Lei do Pântano”
(também conhecida como “Crônicas da Margem das Águas”), escrita entre 1290 e 1400
por Shi Nai’na e Luo Guanzhong. A novela se refere a fatos reais ocorridos no
período de vida de Yue Fei.
(7) – “Zu Lai Tzu” – De todos os componentes da placa, este foi o de
tradução mais incerta. Em princípio, Zu Lai é um termo budista chinês oriundo
da transliteração do termo indiano Vairocana, “aquele que vem com o sol”. No
Budismo Mahayana, Zu Lai (Vairocana) seria a contraparte cósmica de Sakyamuni.
O mais intrigante, em relação ao termo, é a terminação Tzu, que, em princípio,
poderia ser traduzida como “Venerável” ou “Sábio”. Provavelmente essa
terminação possa não ser aplicada à divindade, uma vez que, normalmente,
designa seres humanos. Além disso, há que se considerar o contexto da placa: em
um elemento iconográfico quase que exclusivamente confucionista, a presença de
uma figura budista altamente esotérica parece incongruente.
(8) – “Zhang Xian” – Genro de Yue Fei, se manteve leal a ele. Acabou
preso, executado e sepultado junto com o sogro e com o cunhado, Yue Yun.
(9) – “Yue Yun” – A referência, nesses ideogramas, é a um indivíduo,
mais propriamente a Yue Yun, filho mais velho de Yue Fei. Yue Yun viveu na
passagem entre o período das chamadas “Cinco Dinastias e Dez Reinos” e a
Dinastia Song. As cinco dinastias foram Liang Posterior, Tang Posterior, Jin
Posterior, Han Posterior e Zhou Posterior; os dez reinos foram Wu, Shu Inicial,
Wu Yue, Min, Tang do Sul, Chu, Han do Sul, Nan Ping, Shu Tardio e Han do.
A época, que sucedeu à Dinastia Tang, e antecedeu à Dinastia Song, foi de
violentos confrontos pelo poder. Por volta de 1130, as tropas da Casa de Song,
lideradas pelo general Yue Fei, haviam imposto sérias derrotas ao reino de Jin
e estavam prestes a dominar a cidade de Kaifeng. Por instigação de um traidor
chamado Qin Hui, o imperador Gao Zong foi convencido de que deveria abandonar o
combate e adotar uma estratégia de paz e alianças. Por conta disso, Yue Yun,
Yue Fei e Zhang Xian foram chamados a Nanjing, onde acabaram presos. Foram
executados em 1141.
(10) – “Genealogia Shaolin” – A finalidade do texto central da placa do
Shaolin do Norte é indicar a origem do estilo praticado. Tanto, que os dois
primeiros ideogramas (leitura de cima para baixo) são Sao e Lin (Shaolin). A
coluna ainda relaciona os nomes de Ta Mo (Bodhidharma) como fundador da arte
marcial e, também, o de Yue Fei/Yue Wei.
(11) – “Sao Lin” (Shaolin) – “Bosque [do Pico] Shao ”, nome do mosteiro
construído por volta de 495 na cadeia de montanhas Song (Songshan), em Henan.
(12) – “Fundador” – Os dois ideogramas identificam Ta Mo como fundador
da marcialidade em Shaolin.
(13) – “Ta Mo (Bodhidharma)” – Considerado o patriarca do Zen Budismo,
Bodhidharma teria chegado à China no início do século VI. Ele teria vivido no
mosteiro de Shaolin por sete anos, entre 520 e 527. Segundo a tradição das
artes marciais, ele teria ensinado aos monges uma série de técnicas
respiratórias que estariam na base do estilo de luta originário do templo.
(14) – “Yue Fei/Yue Wan” – Como observado no item 9, Yue Fei foi um
general da Dinastia Song. Ainda sobre este personagem, vale observar que ele
foi alçado à condição de divindade pela religiosidade popular. Herói nacional,
passou a ser reverenciado como padroeiro dos exércitos e, no norte da China
durante a primeira metade do século XX, como “Deus da Guerra”. Em tempos
recentes passou, também, a ser a divindade tutelar de mercadores e lojistas (em
Beijing, ainda hoje os lojistas chacoalham seus ábacos pela manhã para
homenagear Yue Fei).
Fonte: Câmara Shao Lin
Sifu Moacyr Rother Neto, Wing Chun Family Rother
Sifu Moacyr Rother Neto, Wing Chun Family Rother
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